No início dos tempos não havia divisão entre o Orum (céu) e o Aiê (terra). Certa ocasião, um casal de velhos pediu uma audiência com Oxalá para implorar a graça de conceberem um filho, pois estavam já bastante idosos e nunca conseguiram essa dádiva.
A princípio Oxalá recusou-se a atendê-los, pois se era a vontade de Olorum que eles não tivessem um filho, deveriam submeter-se a isso. Mas os velhos tanto choraram, gritaram e se rasgaram perante ele, que, condoído, cedeu. Porém, impôs uma condição: que eles jamais deixassem seu filho entrar no Orum que era a morada dos deuses. Contentes, juraram que assim seria e voltaram felizes para casa. Conforme o prometido, logo tiveram o filho tão desejado que crescia forte e bonito, mas com um pequeno defeito, era curioso demais. Tudo queria saber, em tudo mexia e de tudo falava.
Os pais com muito medo de que ele descobrisse o Orum, foram morar num ponto muito distante. Aconteceu, porém, que as terras onde o velho trabalhava davam passagem para o céu e, por isso, todos os dias ele saia escondido para plantar, sabendo que se a criança conhecesse a plantação ficaria curioso e tudo faria para conhecer todos os cantinhos do terreno.
Num dia de descuido, o menino escondeu-se dentro de um saco que o pai levava para o trabalho e assim chegou perto do caminho proibido. Ao sair do esconderijo, andou, brincou, vasculhou, e tanto fez que acabou descobrindo a divisa do Orum. Ficou boquiaberto com tamanha beleza e foi entrando devagar, admirando tudo que via num encantamento enorme. Em poucos minutos estava a correr pelos jardins do céu, fazendo grande algazarra.
Os guardas do palácio de Oxalá logo tomaram conhecimento da invasão e em pouco tempo pegaram o menino e arrastaram-no pelos caminhos. A criança gritava e esperneava, mas de nada adiantava, pois os guardas o prendiam firmemente. Tão grande foi o barulho que Oxalá veio ver o que estava acontecendo.
Ao reconhecer o filho do casal de velhos ficou surpreso. Era muita ousadia do pirralho invadir o local onde estava proibido de entrar desde antes de seu nascimento. Oxalá ficou tão pesaroso pela quebra do tabu que bateu seu cajado no chão com tamanha força que atravessou os nove espaços do Orum. Ao retirá-lo, viu que deixara uma enorme rachadura no universo. E foi dessa rachadura que nasceu o firmamento, separando o Aiê do Orum para sempre.
Após esse acontecimento, os orixás ficaram no Orum e os homens confinados no Aiê para sempre, só podendo lá entrar novamente após a morte, se assim o merecerem.
Luiz Carlos Pereira
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