domingo, 24 de maio de 2009

Exu Tata Caveira


Adalberon nunca teve escrúpulos. Aos quarenta e dois anos tornara-se um comerciante rico e influente na pequena ilha onde sua palavra era quase lei. Amealhou sua fortuna a custa de trapaças e mentiras. Causara grande sofrimento a muitos rivais que hoje padeciam na miséria enquanto sua riqueza somente aumentava. Hoje, porém daria o golpe mais espetacular já imaginado pela sua mente treinada em maquinações perversas. Iria até o conselho dos cidadãos e com seu testemunho falso acusaria Cleto de enriquecimento ilícito por roubo nos cofres públicos. Era uma mentira muito bem urdida por ele próprio. O rapaz tornara-se seu melhor amigo e ele melhor que ninguém sabia de sua inocência. Porém Tormena, a mulher de Cleto, tornara-se sua obsessão. Faria seu juramento e de antemão sabia que não haveria chance para o jovem. Seria degredado e morreria longe da terra onde nascera deixando a mulher e a fortuna nas mãos de quem era seu amigo e confidente, ele. Passara a noite em claro planejando a forma mais eloqüente de prestar seu testemunho e orgulhava-se intimamente de sua capacidade e inteligência. No dia anterior fora visitar o prisioneiro e jurara defende-lo. - Tudo farei meu caro, para que saia ileso dessa acusação vil que te impingem! - O rapaz comovido agradeceu: - Muito obrigado meu amigo, sei de vosso apreço por mim e minha família e confio que com seu desmentido, amanhã mesmo estarei livre junto aos meus. Porém, se algo der errado prometa-me que cuidará de meus negócios para que a querida Tormena não seja enganada por pessoas inescrupulosas. - A resposta veio aliada a um abraço apertado - Não te atormentes tudo farei por ti e tua bela esposa. Sairás livre!
Ao final do julgamento, Adalberon sorria intimamente, tudo ocorrera da forma planejada. Apenas uma coisa o incomodava, a lembrança do olhar que Cleto lhe lançara no momento em que jurara serem verdades as mentiras apregoadas Foi um misto de surpresa, ódio e repulsa que ele sentira de forma profunda. Mas isso passaria o que importava era poder ser abraçado pela bela mulher, para ela, juraria ter feito de tudo para salvar seu marido, mas as provas eram concludentes demais. Ela, inocente e desamparada não tardaria a perdoá-lo. Então seriam felizes. Ao chegar à residência do casal notou um movimento estranho, ouviu gritos, acalmou-se, no entanto. Era natural que a jovem se desesperasse diante do ocorrido. Uma das escravas da casa, ao ve-lo, correu ao seu encontro: - Senhor! Dona Tormena se enforcou! - A surpresa o fez cambalear, o chão sumiu de seus pés. A única lembrança que teve foi do olhar lançado pelo jovem Cleto a ele. Uma dor profunda tomou seu peito. Caiu, enquanto a escrava tentava segura-lo. Nada havia a ser feito. O coração do ambicioso homem parara definitivamente.
Durante muitos anos Adalberon expiou seus inúmeros delitos em zonas espirituais inferiores. Hoje nos trabalhos onde se apresenta como o Exu Tata Caveira, mostra-se taciturno e equilibrado, tem um dos períodos mais longos de expiação em sua lei. Tornou-se então um conselheiro fiel e justo e, sempre que possível, enaltece as virtudes da verdadeira amizade. Sarava Sr. Tata Caveira!
Luiz Carlos Pereira

2 comentários:

Anônimo disse...

Laroiê, Saravá, Salve! Malê, Malembe (Maleime, Maleme), Agô! Axé, Axé, muito Axé!...

Anônimo disse...

Laroie! Male! Axe!!!